Oito das 17 plataformas digitais mais populares no Brasil monitoram e armazenam informações pessoais de quem sequer possui perfil nesses serviços, indica um levantamento do Centro de Tecnologia e Sociedade (CTS) da Fundação Getulio Vargas (FGV). A prática, conhecida como mineração de dados, utiliza rastreamento automatizado para reunir conteúdos disponíveis na internet sem o conhecimento direto do cidadão.
Falhas generalizadas na conformidade com a LGPD
Realizado entre maio e julho de 2024, o estudo avaliou 16 critérios previstos na Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD), que está em vigor há mais de quatro anos. Nenhuma plataforma atingiu o cumprimento total das exigências legais. Segundo os pesquisadores, LinkedIn e TikTok foram as únicas empresas que informaram quais dados de não usuários são coletados. Instagram, Facebook, Threads, Reddit, X (antigo Twitter) e YouTube não responderam às solicitações.
Além da coleta de informações de pessoas sem conta, o levantamento identificou outras brechas significativas. Quando a análise foi concluída, nenhuma rede social indicava o encarregado de dados — profissional responsável por dialogar com titulares e autoridades. Posteriormente, Meta, X, Telegram e YouTube passaram a nomear oficialmente seus representantes, mas apenas após questionamentos públicos.
Em relação às decisões automatizadas — etapa em que algoritmos tomam decisões sem intervenção humana — apenas LinkedIn e Telegram atenderam plenamente às regras de transparência. Meta e X obtiveram pontuação parcial, enquanto o Signal registrou o pior desempenho entre as 17 plataformas avaliadas.
Riscos para usuários e não usuários
A Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD) classificou a coleta de dados de não usuários como prática de alto risco. O órgão alerta que, sem anonimização adequada, informações sensíveis podem ser vinculadas a indivíduos, inclusive crianças e adolescentes, aumentando a possibilidade de exposição indevida e vazamentos.
Em 2024, a ANPD utilizou um modelo de análise de risco baseado em número de usuários e potencial de dano para suspender temporariamente o uso de dados brasileiros pela Meta em projetos de inteligência artificial. A empresa reverteu a decisão três meses depois, ao criar um formulário que permite a não usuários solicitar a exclusão de seus dados.
Especialistas ouvidos pelos pesquisadores afirmam que a lacuna entre a lei e a prática mantém titulares em posição de vulnerabilidade. Embora a LGPD garanta o direito de acesso e correção, muitos cidadãos desconhecem que suas informações foram coletadas, o que inviabiliza o exercício desses direitos.
Diferenças de recursos ampliam a desigualdade
O estudo destaca que empresas com maior infraestrutura financeira tendem a cumprir mais requisitos. A Meta, por exemplo, obteve a melhor nota geral (12,5 de 16 pontos) ao investir em equipes jurídicas e processos de conformidade. Por outro lado, plataformas menores, como Signal, enfrentam custos elevados para adequação, o que aprofunda a assimetria no setor.
Pesquisadores ressaltam que a falta de padronização torna a fiscalização mais complexa. Cada rede social define formatos distintos para disponibilizar políticas de privacidade, o que dificulta a comparação entre documentos. Segundo dados oficiais, a ANPD vem priorizando ações educativas e negociações, mas não descarta novas sanções em caso de reincidência.

Imagem: Ahyan Stock Studios
Impacto direto para o público
A coleta de dados de não usuários interfere no cotidiano de qualquer pessoa que navegue na internet, mesmo sem possuir perfis nas redes sociais mencionadas. Informações como endereço IP, hábitos de navegação e preferências de consumo podem ser agregadas a bancos de dados comerciais, gerando publicidade direcionada e perfis comportamentais sem consentimento. Para o consumidor, isso significa receber ofertas ou recomendações baseadas em informações que ele desconhece ter fornecido.
No ambiente corporativo, a incerteza regulatória eleva custos de conformidade e pode gerar barreiras de entrada para novos concorrentes. Segundo analistas do mercado digital, o nível de adequação à LGPD tende a se tornar diferencial competitivo, especialmente em setores que lidam com dados sensíveis, como saúde, finanças e educação.
Na prática, o usuário — ou mesmo quem não possui conta — tem algumas alternativas: consultar periodicamente se seus dados aparecem em formulários de exclusão, enviar solicitações de acesso quando possível e recorrer aos canais da ANPD em caso de negativa. Entretanto, especialistas reconhecem que esses caminhos ainda exigem conhecimento técnico e persistência.
Para quem acompanha o tema, vale lembrar que a seção de Tecnologia do Remanso Notícias traz atualizações frequentes sobre proteção de dados e tendências de privacidade, ajudando o leitor a entender mudanças regulatórias e novas práticas do setor.
Em síntese, o estudo da FGV revela um cenário no qual redes sociais continuam coletando informações de forma pouco transparente, mesmo após quatro anos da LGPD. O panorama pressiona empresas, reguladores e usuários a buscar soluções que conciliem inovação com respeito aos direitos fundamentais.
Curiosidade
Você sabia que a prática de mineração de dados de não usuários não é exclusiva das redes sociais? Serviços de e-mail e até aplicativos de previsão do tempo já foram flagrados rastreando endereços IP e padrões de uso de pessoas que apenas visualizaram conteúdos incorporados. Esse fenômeno ilustra como pequenas interações digitais podem gerar um rastro valioso, reforçando a urgência de políticas de privacidade mais abrangentes.
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