Cientistas reproduziram em laboratório o ambiente gelado de Encelado, lua de Saturno, e concluíram que a radiação espacial é capaz de produzir diversas moléculas orgânicas já identificadas nos jatos de gelo que escapam da superfície. A descoberta sugere que parte desses compostos pode não vir do oceano subterrâneo — considerado um dos locais mais promissores para a busca por vida fora da Terra —, mas sim de reações químicas induzidas por partículas energéticas no exterior da crosta gelada.
O experimento que recriou a química de Encelado
O trabalho foi conduzido pela pesquisadora Grace Richards, do Instituto Nacional de Astrofísica de Roma, e apresentado no Europlanet Science Congress-DPS, em Helsinque. A equipe misturou água, dióxido de carbono, metano e amônia — principais constituintes esperados no gelo superficial da lua —, resfriou a 200 °C negativos em câmara de vácuo e bombardeou o material com íons de água, componente relevante da radiação que circunda o satélite.
Segundo o relatório publicado na revista Planetary and Space Science, essa exposição gerou um “coquetel” de compostos: monóxido de carbono, cianato, amônio, vários álcoois e precursores de aminoácidos como formamida, acetileno e acetaldeído. Todos já haviam sido detectados pela sonda Cassini nos voos rasantes realizados entre 2005 e 2015 através das plumas de Encelado.
Para Richards, os resultados não descartam a possibilidade de um oceano habitável sob a crosta. Contudo, reforçam a necessidade de separar o que é produzido no interior do que se forma na superfície ou no vácuo próximo. “Quando se infere a composição do oceano a partir do que se observa no espaço, é crucial entender todos os processos que modificam esse material”, afirmou a pesquisadora.
Conflito de interpretações sobre a origem dos compostos
Desde a missão Cassini, a presença de moléculas orgânicas complexas nos jatos polares alimenta a hipótese de um ambiente quimicamente rico abaixo do gelo, com ingredientes essenciais à vida. Entretanto, os novos testes indicam que, ao menos para espécies simples, a radiação sozinha pode explicar sua existência.
Nem todos os especialistas convergem. Análise recente liderada por Nozair Khawaja, da Universidade Livre de Berlim, descreveu grupos de ésteres e éteres em grãos de gelo recém-expelidos, moléculas que exigiriam reações mais longas e complexas. Os dados sugerem que esses grãos permaneceram poucos minutos no espaço antes de serem amostrados, tempo considerado insuficiente para a química induzida por radiação produzir estruturas tão elaboradas.
Alexis Bouquet, do Centro Nacional de Pesquisa Científica da França, ressalta que simulações laboratoriais são fundamentais para preparar futuras missões, especialmente às luas de Júpiter, onde o ambiente radioativo é ainda mais intenso. “Demonstrar que muitas espécies podem surgir nessas condições ajuda na interpretação das medições”, comentou.
Impacto para missões a Encelado e outras luas geladas
Os resultados influenciam o desenho de instrumentos que irão voar em sondas como Europa Clipper (NASA) e JUICE (ESA), dedicadas a Europa, Ganimedes e Calisto. Segundo especialistas, distinguir compostos fabricados pela radiação daqueles vindos de oceanos internos exigirá espectrômetros mais sensíveis, amostragem em diferentes altitudes e correlação com modelos de tempo de residência das partículas no espaço.

Imagem: Javier Barbuzano published
Para Encelado, a Agência Espacial Europeia estuda uma missão específica que pode combinar sobrevoos de alta velocidade e um pouso no polo sul. Entender como a radiação altera o material ejetado ajudará a selecionar locais de amostragem e a calibrar a interpretação dos dados. “Cada processo identificado permite reduzir incertezas sobre a real composição do oceano”, afirmam relatórios técnicos da ESA.
Na prática, isso pode mudar a maneira como o público enxerga a busca por vida. Se parte dos sinais orgânicos for gerada externamente, a simples detecção de moléculas não bastará para indicar biosfera. Será preciso verificar padrões isotópicos, concentrações anômalas e cadeias moleculares pouco prováveis em síntese abiótica.
Curiosidade
Apesar de ter apenas 500 km de diâmetro, Encelado projeta plumas que alcançam centenas de quilômetros e chegam a abastecer o anel E de Saturno. Cassini atravessou esses jatos a menos de 30 km da superfície, registrando amostras que abriram caminho para a atual discussão sobre radiação versus oceanos subterrâneos.
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Resumindo: o novo estudo reforça que a radiação espacial desempenha papel ativo na química de Encelado, exigindo cautela na interpretação de sinais orgânicos. Fique ligado em nossas próximas reportagens e compartilhe esta notícia para manter a discussão em movimento.
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