Flashes misteriosos na Lua intrigam cientistas e podem ocorrer oito vezes por hora

Ciência

Fenômenos luminosos breves e localizados têm sido observados na superfície lunar há mais de mil anos, mas ainda carecem de uma explicação definitiva. Documentados como Fenômenos Lunares Transitórios (LTPs, na sigla em inglês), esses flashes foram descritos em relatos que remontam ao século VI e, segundo levantamentos, já somam milhares de ocorrências registradas. A hipótese de impactos de meteoritos é hoje a mais aceita, porém outras possibilidades, como a liberação de gases do subsolo, permanecem em análise.

Registros históricos reforçam frequência dos LTPs

Um levantamento de relatos feitos entre 557 d.C. e 1994 identificou 2.254 observações com informações suficientes para investigação. Destas, 645 foram confirmadas por mais de um observador ou por instrumentos, como fotografias, espectros e medições fotométricas. Outros 448 registros não puderam ser atribuídos a distorções atmosféricas ou problemas de equipamentos, apontando probabilidade de origem lunar.

Entre os episódios mais conhecidos está o de 18 de junho de 1178. Na data, monges britânicos relataram um clarão intenso na Lua, descrito pelo cronista medieval Gervase de Canterbury: o “chifre” superior do satélite teria se dividido, liberando faíscas e fogo antes de retornar ao estado normal. Esse relato foi um dos primeiros a sugerir atividade física na superfície lunar, muito antes da era dos telescópios.

O termo “fenômenos lunares transitórios” foi popularizado apenas em 1939 pelo astrônomo amador Patrick Moore, que afirmou ter observado vários desses flashes durante décadas. Em 1958, o astrônomo soviético Nikolai Kozyrev registrou um LTP avermelhado na cratera Alphonsus e coletou espectrogramas que reforçaram a existência do fenômeno.

A percepção de que os flashes seriam raros mudou com avanços tecnológicos. Entre 2017 e 2023, o projeto NELIOTA, da Agência Espacial Europeia (ESA), monitorou trechos parcialmente escuros da Lua e detectou 55 eventos em somente 90 horas de observação. A partir desses dados, a ESA estimou a ocorrência média de quase oito flashes por hora em toda a superfície lunar.

Meteoritos, gases ou instabilidade ótica?

A explicação mais debatida atualmente é o impacto de pequenos meteoritos. Sem atmosfera densa para desacelerar detritos espaciais, a Lua é um alvo direto: colisões em alta velocidade gerariam breves explosões luminosas visíveis a partir da Terra. Segundo especialistas, a taxa de flashes calculada pelo NELIOTA é compatível com a densidade de micrometeoritos na órbita terrestre.

Apesar de robusta, essa hipótese não cobre todos os casos. A missão Clementine, da NASA, registrou quatro flashes em 1994, mas inspeções posteriores não encontraram alterações nas crateras correspondentes. De acordo com pesquisadores, isso pode indicar que alguns LTPs resultem de fenômenos distintos.

Uma segunda linha de investigação relaciona os flashes à liberação de radônio ou outros gases do subsolo lunar. Em 2007, o astrônomo Arlin Crotts, da Universidade Columbia, publicou análise que correlacionou pontos de emissão gasosa com locais de ocorrências de LTPs. Ele argumentou que nenhum efeito terrestre — como turbulência atmosférica ou erro instrumental — reproduz a distribuição desses eventos.

Há ainda registros cujas cores variam entre tons avermelhados e esverdeados, sugerindo processos físicos diferentes dos impactos meteóricos. Relatórios indicam que a intensidade e a duração também oscilam; alguns flashes duram frações de segundo, enquanto outros permanecem visíveis por vários minutos, obscurecendo detalhes da superfície ou mudando o brilho de regiões específicas.

O que a ciência busca descobrir

Resolver o enigma dos LTPs é relevante para diversas frentes da exploração espacial. Impactos meteóricos frequentes podem influenciar o planejamento de missões tripuladas, exigindo estruturas de proteção adicionais em bases lunares. Já a possível liberação de gases abriria discussão sobre atividade geológica residual no satélite, tema que redefiniria o entendimento de sua evolução.

Além disso, monitorar os flashes auxilia na calibração de sistemas de vigilância terrestres: detectar e distinguir eventos lunares de artefatos ópticos melhora a precisão de telescópios robóticos usados para rastrear objetos próximos à Terra. “Compreender a origem dos LTPs fornece um laboratório natural para estudar colisões de alta velocidade e dinâmica de regolito”, apontam pesquisadores da ESA em relatórios internos.

Para o leitor, o avanço nos estudos pode refletir em melhorias tecnológicas de larga escala. Processadores de imagem mais sensíveis, sensores de baixa luminosidade e algoritmos de filtragem desenvolvidos para captar flashes lunares tendem a migrar para câmeras comerciais, satélites meteorológicos e sistemas de segurança.

Curiosidade

Embora os LTPs sejam observados desde a Antiguidade, poucos sabem que a Lua foi o primeiro corpo celeste a receber vigilância contínua por telescópios automáticos dedicados exclusivamente a eventos de curto prazo. Programas como o NELIOTA utilizam câmeras de alta velocidade capazes de gravar 30 quadros por segundo, tecnologia equivalente à empregada em filmagens de esportes — um exemplo de como soluções originadas na astrofísica acabam impactando diferentes áreas.

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