A Blue Origin realizou com êxito, em 13 de novembro, o segundo voo do foguete New Glenn e, pela primeira vez, recuperou integralmente o primeiro estágio do veículo. A operação marcou também o início da missão ESCAPADE da NASA, composta por dois pequenos satélites que investigarão o clima espacial em Marte.
Lançamento e pouso inédito
O New Glenn decolou às 15h55 (horário da Costa Leste dos EUA) a partir do Complexo de Lançamento 36, na Estação da Força Espacial de Cabo Canaveral, Flórida. Após pouco mais de três minutos, o primeiro estágio — batizado “Never Tell Me The Odds” — desligou seus sete motores BE-4 e separou-se do topo do foguete. Nove minutos e 15 segundos depois da partida, o estágio pousou no navio-plataforma Jacklyn, no Oceano Atlântico, registrando a primeira recuperação bem-sucedida de um veículo dessa classe no segundo voo.
De acordo com Dave Limp, diretor-executivo da Blue Origin, “nunca antes um propulsor tão grande realizou um pouso perfeito já na segunda tentativa”. No voo inaugural, em janeiro, os motores não religaram na descida e a tentativa de pouso falhou.
Carga útil e separação em órbita
O lançamento transportou a missão Escape and Plasma Acceleration and Dynamics Explorers (ESCAPADE), formada por dois satélites idênticos de 535 quilos chamados Blue e Gold. Construídos pela Rocket Lab, os cubesats foram liberados com intervalo de 30 segundos, cerca de 33 minutos após a decolagem, logo depois de uma segunda queima do estágio superior do New Glenn.
Além da ESCAPADE, o voo levou um equipamento de demonstração da Viasat para o Programa de Serviços de Comunicação da NASA, que busca migrar de redes governamentais para soluções comerciais. Esse segundo experimento permanecerá acoplado ao estágio superior para testes futuros.
Próximas etapas da missão ESCAPADE
Segundo Dave Curtis, gerente do projeto, engenheiros da Rocket Lab passarão as duas primeiras semanas realizando a checagem dos sistemas e preparando uma manobra planejada para o 14º dia pós-lançamento. O objetivo é direcionar os satélites ao ponto de Lagrange L2 Terra-Sol, a 1,5 milhão de quilômetros de distância.
Os veículos permanecerão cerca de um ano em órbita “rimiforme” ao redor do L2 antes de retornarem às proximidades da Terra, no fim de 2026, para um impulso que os enviará a Marte. A chegada ao planeta vermelho está prevista para setembro de 2027, quando iniciarão medições simultâneas do vento solar e da atmosfera marciana.
Modelo de baixo custo e maiores riscos
A ESCAPADE integra a linha SIMPLEx da NASA, dedicada a missões planetárias de orçamento reduzido. Estimado em aproximadamente US$ 60 milhões, o projeto precisou ser redesenhado depois que mudanças na missão Psyche inviabilizaram o lançamento conjunto inicialmente previsto em um Falcon Heavy. A agência selecionou o New Glenn em 2023 e, apesar de um adiamento que acrescentou entre US$ 5 milhões e US$ 7 milhões ao custo, especialistas afirmam que o cronograma permanece dentro da margem considerada aceitável para o formato de contratação a preço fixo.
Richard French, vice-presidente de desenvolvimento de negócios da Rocket Lab, explicou que a estratégia de permanecer no L2 acrescenta manobras extras e exposição maior à radiação, mas o risco foi avaliado como compatível com a capacidade dos satélites. Rob Lillis, cientista principal da missão na Universidade da Califórnia em Berkeley, destacou que o perfil “Classe D” da NASA permite assumir riscos mais elevados em troca de economia e agilidade.
Potencial científico e impacto para futuras missões
A dupla de satélites começará a operar em órbitas semelhantes, separadas por intervalos que variam de 2 a 30 minutos, o que permitirá observar variações rápidas no ambiente de plasma marciano. Posteriormente, cada espaçonave adotará trajetórias distintas, ampliando a cobertura e oferecendo uma visão estereoscópica sem precedentes do clima espacial no planeta.
Imagem: Blue Origin
Segundo pesquisadores, compreender a interação entre vento solar, magnetosfera e atmosfera de Marte ajudará a esclarecer como o planeta perdeu boa parte do ar ao longo de bilhões de anos — dado essencial para o planejamento de missões robóticas e, futuramente, tripuladas. Relatórios da NASA reforçam que o modelo de satélites pequenos e relativamente baratos pode acelerar o ritmo de pesquisas planetárias e ampliar a variedade de alvos científicos.
Novo impulso para o mercado de lançamentos
Para a Blue Origin, o sucesso duplica a importância do segundo voo do New Glenn: além de cumprir uma missão da NASA, a empresa demonstra a capacidade de recuperação do maior foguete reutilizável após o Falcon 9 e o Falcon Heavy. Analistas do setor observam que ampliar a cadência de lançamentos reutilizáveis tende a reduzir custos e aumentar a concorrência por contratos governamentais e comerciais.
Na prática, a possibilidade de lançar cargas mais pesadas com recuperação do propulsor pode estimular novas missões científicas e o envio de satélites de comunicação de maior porte, beneficiando clientes que buscam preços mais competitivos e cronogramas flexíveis.
Para o leitor, a combinação de reutilização eficiente e missões científicas de baixo custo indica um cenário em que lançamentos de médio e grande porte se tornarão mais frequentes, ampliando o acesso a serviços de banda larga, observação da Terra e exploração planetária.
Curiosidade
Marte possui apenas vestígios de campo magnético global, mas regiões rochosas preservam magnetização residual. Ao voarem em formações variáveis, os satélites da ESCAPADE poderão comparar diretamente áreas com e sem esse “escudo fragmentado”, ajudando a entender como pequenas diferenças na magnetização local influenciam a fuga de partículas da atmosfera marciana.
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