Uma equipe de engenheiros aeroespaciais apresentou novos resultados que sugerem ser possível diminuir pela metade a incidência de enjoo em astronautas durante a reentrada na Terra usando headsets de realidade virtual (RV). O trabalho, divulgado recentemente, testou diferentes estratégias visuais para minimizar o conflito sensorial que causa náuseas após longos períodos em microgravidade.
Conflito entre expectativas do cérebro e falta de gravidade
Todos os astronautas são treinados e vivem na Terra, onde o sistema vestibular se baseia na ação constante da gravidade para interpretar movimentos. No espaço, esse referencial desaparece. A partir dos primeiros minutos em órbita, muitos tripulantes relatam sintomas que vão de tontura leve a vômitos intensos. De acordo com dados oficiais da própria agência espacial norte-americana, mais da metade dos ocupantes de estações e naves vivencia algum grau de enjoo espacial.
Esse desconforto costuma diminuir após alguns dias, quando o cérebro se adapta ao novo ambiente. Contudo, o processo se repete ao retornar ao planeta. Como as cápsulas modernas pousam no mar, os ocupantes ainda precisam enfrentar o balanço das ondas enquanto aguardam resgate, o que pode agravar o problema. Em situações de emergência, a incapacidade de agir rapidamente representa um risco operacional adicional.
Experimento compara três cenários visuais
Para investigar soluções não farmacológicas, o grupo submeteu voluntários a movimentos que simulavam transições de gravidade, seguidos de uma hora de oscilação semelhante à de uma cápsula flutuando no oceano. Durante essa fase, os participantes usaram ou não um visor de RV, formando três grupos:
• Controle: sem qualquer imagem de movimento, reproduzindo o que acontece quando o astronauta não enxerga o exterior.
• Janela lateral virtual: cenário que se deslocava de acordo com o balanço, como se o indivíduo olhasse pela janela lateral de um veículo.
• Janela frontal virtual com previsão: além do movimento sincronizado, o sistema exibia indicações do deslocamento futuro, simulando a visão da estrada à frente.
Os resultados apontaram que dois terços dos integrantes do grupo controle interromperam a sessão antes do fim por náusea intensa. Entre os que receberam a janela lateral, essa taxa caiu para cerca de 20%. O melhor desempenho ocorreu no grupo que visualizava presente e futuro do movimento: apenas 10% desistiram.
Menos dependência de medicamentos
Atualmente, a principal defesa contra o enjoo no espaço envolve remédios que bloqueiam a ação de hormônios responsáveis pelo quadro. Embora eficazes, esses fármacos provocam sonolência e podem perder efeito ao longo do tempo, além de exigir cuidados de armazenamento. Os pesquisadores destacam que a alternativa baseada em RV não sofre com validade limitada e não interfere na vigilância dos astronautas.
Segundo especialistas em fatores humanos, a abordagem também oferece vantagem logística: basta rastrear em tempo real o movimento da cápsula e reproduzi-lo no visor. Caso seja possível prever a trajetória das ondas com algoritmos, a experiência se aproxima ainda mais da janela frontal, ampliando o benefício observado no laboratório.
Imagem: Taylor Lner
Reflexos para o setor aeroespacial e além
Para agências espaciais, a tecnologia abre caminho para cápsulas com menor número de janelas físicas, reduzindo peso, pontos de falha e custo de fabricação. Empresas comerciais que planejam voos de turismo suborbital também podem adotar a solução para aumentar o conforto dos passageiros.
Fora do ambiente espacial, relatórios indicam que o mesmo princípio pode atender pessoas suscetíveis a enjoo em aviões, trens ou ônibus de alta velocidade, onde a vista do percurso nem sempre está disponível. Versões adaptadas do sistema podem ser integradas a assentos de transporte coletivo ou aplicativos de entretenimento de bordo.
O que muda para o usuário comum
A popularização de fones de RV compatíveis com dispositivos móveis permite imaginar, em curto prazo, aplicativos que sincronizem imagens geradas em tempo real com os movimentos do veículo. Para quem sofre com náuseas em viagens, isso significaria menos dependência de medicamentos e, potencialmente, trajetos mais confortáveis.
Quer acompanhar outras inovações que prometem transformar a mobilidade? O leitor pode conferir a cobertura completa em nossa seção de Tecnologia, atualizada diariamente.
Curiosidade
Você sabia que o termo “pegar as pernas do mar” existe desde o século XV? Marinheiros notavam que, após alguns dias, conseguiam prever o balanço do navio apenas sentindo o convés, reduzindo o enjoo. O estudo com realidade virtual aplica o mesmo princípio de adaptação antecipada, mas traduzido em imagens digitais que permitem ao cérebro “ver” o movimento antes que ele aconteça.
Para mais informações e atualizações sobre tecnologia e ciência, consulte também:
Quando você efetua suas compras por meio dos links disponíveis aqui no RN Tecnologia, podemos receber uma comissão de afiliado, sem que isso acarrete nenhum custo adicional para você!
