PL da Adultização avança e pressiona redes sociais a reforçar proteção a crianças

Tecnologia

No mesmo mês em que vídeos e séries sobre a exposição infantil na internet alcançaram recordes de audiência, a Câmara dos Deputados aprovou regime de urgência para o Projeto de Lei 2.628/2022, conhecido como PL da Adultização. O texto cria novas obrigações para plataformas digitais no tratamento de dados, moderação de conteúdo e mecanismos de segurança aplicados a usuários menores de 18 anos.

Pressão popular acelera tramitação do ECA Digital

A repercussão começou em março de 2025, quando a Netflix lançou a minissérie “Adolescência”. A produção se manteve entre as mais vistas do serviço e estimulou debates sobre privacidade e saúde mental de jovens conectados. Em agosto, o influenciador Felipe Bressanim, o Felca, publicou o vídeo “Adultização” no YouTube, superando 45 milhões de visualizações em apenas duas semanas.

O sucesso do conteúdo ampliou a visibilidade do PL 2.628/2022, que já tramitava no Congresso desde dezembro de 2024. No último dia 19 de agosto de 2025, os deputados aprovaram urgência na análise, encurtando prazos e colocando a proposta na pauta de votação final.

Principais dispositivos do PL 2.628/2022

O projeto estabelece que todo produto ou serviço de tecnologia da informação “direcionado ou que possa ser utilizado” por crianças e adolescentes deverá seguir o princípio do melhor interesse do menor. Entre os pontos de destaque:

  • Proibição de técnicas de perfilamento para publicidade infantil e de análise emocional voltada a menores (Art. 16).
  • Obrigatoriedade de mecanismos ativos que impeçam uso por crianças quando o serviço não for adequado à faixa etária (Art. 5º, parágrafo único).
  • Limitação de recursos que induzam uso prolongado, como reprodução automática de vídeos e notificações que geram dependência (Art. 11, III).
  • Controle de sistemas de recomendação personalizados, permitindo sua desativação (Art. 11, V).
  • Relatórios semestrais, em português, detalhando volume de denúncias, medidas de moderação e melhorias de segurança para serviços com mais de um milhão de usuários menores (Art. 23).

Segundo a Comissão Especial de Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente da OAB-SP, o modelo de negócios das plataformas, baseado na atenção contínua, “produz efeitos perturbadores” sobre o público infanto-juvenil. Para a entidade, o PL corrige lacunas da legislação atual e alinha o país a padrões adotados em outras jurisdições.

Números revelam alcance infantil nas redes

Dados da pesquisa TIC Kids Online Brasil 2024 indicam que 24,5 milhões de brasileiros entre 9 e 17 anos utilizam a internet, o equivalente a 93% da faixa etária. Entre eles, 76% acessam redes sociais, sendo WhatsApp (71%), YouTube (66%), Instagram (60%) e TikTok (50%) os serviços mais populares.

Especialistas consultados apontam que tais plataformas não foram originalmente desenhadas para as necessidades de crianças. “O modelo comercial baseado em anúncios segmentados contradiz princípios de proteção da infância”, observa Maria Mello, coordenadora de digital do Instituto Alana. Já a pesquisadora Brenda Guedes, da Universidade Federal do Ceará, afirma que a “dataficação” da vida infantil, do cotidiano doméstico a marcos de desenvolvimento, eleva riscos de abuso e exploração.

Algoritmos e moderação permanecem no centro do debate

No vídeo que viralizou em agosto, Felca mostrou que, após criar uma conta nova no Instagram e interagir com poucas publicações de crianças, recebeu em menos de cinco minutos recomendações similares acompanhadas de comentários de potenciais aliciadores. Em nota, a Meta declarou possuir “regras rigorosas” contra sexualização infantil e disse remover conteúdo assim que identificado, além de usar inteligência artificial para limitar a interação de adultos suspeitos com contas de menores.

Estudo publicado pelo grupo de pesquisa Violência de Direitos Humanos e Crime Corporativo da USP reforça a existência de uma “falsa bolha de segurança”: usuários acreditam não encontrar material ilegal em plataformas populares, enquanto algoritmos seguem exibindo publicações inadequadas somente a quem não utiliza filtros.

PL da Adultização avança e pressiona redes sociais a reforçar proteção a crianças - Imagem do artigo original

Imagem: Getty

Papel compartilhado entre famílias, empresas e poder público

Advogados e educadores concordam que a proteção de crianças online exige esforços conjuntos. Para a especialista em segurança digital Carolina Christofoletti, perfis infantis precisam ser classificados como tal pelas próprias plataformas para ativar camadas extras de controle. Ela também defende relatórios transparentes sobre tempo de tela, contatos frequentes e ajustes parentais.

Organizações civis citam o “Guia sobre uso de dispositivos digitais” lançado pelo Governo Federal em 2025 como referência para pais e responsáveis. TikTok e YouTube informam oferecer manuais e aplicativos específicos — como o YouTube Kids —, além de limitar recomendações repetidas e empregar IA para estimar idade dos usuários.

O que muda para o usuário se o PL for aprovado?

Caso o texto seja sancionado sem alterações, fornecedores de tecnologia precisarão repensar fluxos de cadastro, publicidade, design de interface e coleta de dados. Especialistas preveem ajustes técnicos semelhantes ao que ocorreu na Europa após a entrada em vigor do GDPR e do Código de Design Apropriado para Crianças do Reino Unido. Para usuários, isso pode significar menos notificações, anúncios segmentados e sugestões automáticas, tornando as plataformas menos intrusivas e contribuindo para uma navegação mais segura.

Curiosidade

Quando a TV começou a exibir programação destinada a crianças na década de 1950, reguladores norte-americanos criaram limites de publicidade de até 12 minutos por hora. Setenta anos depois, o PL da Adultização busca estabelecer freios equivalentes no ambiente digital, mostrando que, à medida que os meios se transformam, a preocupação com a exposição infantil permanece a mesma.

Para mais informações e atualizações sobre tecnologia e ciência, consulte também:

Se deseja continuar acompanhando os avanços na regulação do ambiente online, veja nossa cobertura sobre iniciativas de inteligência artificial em proteção de dados em outra reportagem da editoria de Tecnologia. Acompanhe o portal e fique por dentro de como novas leis podem afetar seu uso diário das redes sociais.

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