Gelo seco escava ravinas em Marte e desafia teorias sobre água no planeta

Tecnologia

Blocos de dióxido de carbono sólido, popularmente chamado de “gelo seco”, podem ser os responsáveis por sulcos sinuosos observados em dunas marcianas há anos. Um experimento conduzido por cientistas da Universidade de Utrecht, nos Países Baixos, reproduziu em laboratório as condições de temperatura e pressão do planeta vermelho e demonstrou como essas placas de CO2 são capazes de deslizar, sublimar e cavar canais parecidos com trilhas de animais subterrâneos. O estudo foi publicado em 8 de outubro na revista Geophysical Research Letters.

Como o fenômeno foi reproduzido em laboratório

Para validar a hipótese, os pesquisadores montaram uma câmara que simula a atmosfera rarefeita de Marte, mantendo baixas temperaturas e pressão reduzida. Dentro do aparato, pequenas dunas de areia foram posicionadas em diferentes inclinações. Sobre essas dunas, os cientistas colocaram blocos de gelo seco resfriados até próximo de –80 °C, valor típico do inverno marciano.

À medida que o ambiente foi aquecido gradualmente, as placas começaram a sublimar — processo em que o sólido se transforma diretamente em gás. O CO2 gasoso acumulou-se na base do bloco, aumentando a pressão até criar uma espécie de “almofada” que reduziu o atrito com a areia. Impulsionado por esse colchão de gás, o bloco desceu encosta abaixo, escavando um sulco estreito e empurrando grãos para as laterais, formando bordas elevadas em miniatura. Segundo os autores, o trajeto zigzagueante é explicado por pequenas irregularidades no terreno, como cristas de vento, que desviam a trajetória a cada poucos centímetros.

Implicações para a geologia marciana

As ravinas marcianas chamam atenção por aparentarem ser formações recentes, já que preservam bordas nítidas e pouca erosão. Por muito tempo, cogitou-se que água líquida ou lama congelada pudessem ter papel na escultura dessas feições. No entanto, a presença de água líquida em Marte atualmente é contestada pela temperatura média de –63 °C e pela baixa pressão atmosférica, insuficiente para manter o estado líquido em superfície.

O resultado do grupo de Utrecht oferece uma explicação puramente física e independente de água. Segundo especialistas em planetologia, a descoberta reduz a necessidade de invocar processos hidrológicos recentes, reforçando a visão de que Marte permanece ativo mesmo em condições áridas. Além disso, os dados sugerem que a atividade do gelo seco ocorre todo início de primavera marciana, quando a luz solar aquece a areia e favorece a ruptura das placas formadas durante o inverno.

Comparação com estudos anteriores

Relatórios da missão HiRISE, câmera de alta resolução a bordo da sonda Mars Reconnaissance Orbiter, já haviam identificado trilhas de tonalidade diferente recortando dunas de areia na região polar sul. Em 2010, outra equipe propôs que gelo seco poderia “surfar” sobre filmes gasosos, mas faltavam experimentos que reproduzissem o processo em escala reduzida. O trabalho atual é considerado o primeiro a obter evidência direta em laboratório, ligando a dinâmica do gelo seco à morfologia observada do espaço.

O que muda para futuras missões

Para agências espaciais, compreender como o gelo seco interage com o solo é essencial na escolha de locais de pouso e na calibração de sensores de superfície. Equipamentos destinados a investigar possíveis reservatórios de água precisam diferenciar estruturas formadas por CO2 das que possam indicar presença de gelo de água. Segundo os autores, missões que dependam de painéis solares também devem avaliar o risco de deposição de poeira após a passagem desses blocos, já que a ejeção de areia pode reduzir a eficiência dos módulos fotovoltaicos.

Análise de impacto para o leitor: a confirmação de que processos sem água continuam a modelar Marte ajuda a redefinir prioridades na busca por vida passada ou presente no planeta. Para o público, isso significa que descobertas futuras sobre habitabilidade marciana dependerão cada vez mais de evidências químicas e menos de formações superficiais que, até então, pareciam associadas a cursos d’água.

Curiosidade

Embora pareça exclusivo de Marte, o fenômeno do “gelo seco deslizante” já foi observado em menor escala na Antártica, onde placas de CO2 se formam em cavernas vulcânicas. A analogia ajuda pesquisadores a testar equipamentos em solo terrestre antes de enviá-los ao espaço, encurtando o ciclo de desenvolvimento de instrumentos planetários.

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