Um grupo internacional de geocientistas liderado pela professora Nicole Nie, do Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT), apresentou o que descreve como primeira evidência direta de material do “proto-Terra” — estágio inicial do planeta antes do impacto que originou a Lua. O trabalho foi publicado em 14 de outubro na revista Nature Geoscience.
Assinatura química revela origem primordial
Segundo os autores, o indício foi encontrado em um leve desequilíbrio nos isótopos de potássio presentes em rochas muito antigas. Amostras coletadas na Groenlândia, em dois cinturões geológicos do Canadá, nos vulcões Mauna Loa e Kama’ehuakanaloa (Havaí) e no vulcão Newberry (Estados Unidos) exibiram déficit de potássio-40 — isótopo radioativo pouco abundante.
Para chegar ao resultado, as rochas foram pulverizadas, dissolvidas em ácido e analisadas em um espectrômetro de massa de alta precisão. Em paralelo, modelos computacionais testaram se processos conhecidos — como misturas de manto, impactos de asteroides ou convecção interna — seriam capazes de produzir o mesmo sinal isotópico. Nenhum cenário reproduziu a carência de potássio-40 observada, reforçando a hipótese de que parte do manto terrestre manteve-se isolada desde o estágio pré-Lua.
Por que isso importa para a ciência planetária
A maioria dos modelos indica que, há cerca de 4,5 bilhões de anos, um corpo do tamanho de Marte colidiu com a jovem Terra, derreteu grande parte do planeta e lançou material ao espaço, formando a Lua. Acreditava-se que o evento teria homogeneizado a composição do manto, apagando registros químicos anteriores. O novo estudo sugere que porções profundas escaparam dessa mistura e guardam a assinatura da matéria primordial.
Para a comunidade científica, a descoberta pode obrigar a revisar premissas sobre a evolução térmica e química da Terra e de outros mundos rochosos. De acordo com especialistas consultados pelos autores, a preservação desse reservatório antigo indica que a convecção do manto não é tão eficiente em todo o planeta, permitindo a sobrevivência de bolsões intactos por bilhões de anos.
Metodologia combina laboratório e simulação
A equipe primeiramente avaliou meteoritos oriundos de diferentes regiões do Sistema Solar. Essas análises mostraram variações sutis entre isótopos de potássio, sugerindo que o elemento poderia funcionar como rastreador dos blocos que formaram a Terra. Em seguida, os pesquisadores aplicaram a mesma técnica às amostras terrestres mais antigas disponíveis.
O processo laboratorial envolveu a separação química do potássio e a medição, com sensibilidade extrema, das proporções entre potássio-39, potássio-40 e potássio-41. A diferença encontrada não ultrapassa milionésimos, mas é suficiente para caracterizar um “DNA” mineral distinto.
Nos modelos numéricos, os cientistas exploraram múltiplos históricos de impacto, taxas de fusão do manto e ciclos de placas tectônicas. Mesmo os cenários mais extremos geraram quantidades ligeiramente maiores de potássio-40 do que as detectadas. Essa lacuna, segundo os autores, só se explica se parte do manto nunca tiver sido completamente misturada.
Impacto potencial para geologia e mineração
Relatórios indicam que entender a distribuição de elementos radioativos, como o potássio-40, é crucial para estimar o calor interno que dirige vulcanismo, placas tectônicas e formação de depósitos minerais. Caso novos estudos confirmem a existência de bolsões primordiais, as projeções sobre temperatura do interior da Terra e localização de certos minérios estratégicos podem ser ajustadas.

Imagem: Sharmila Kuthunur published
Além disso, a metodologia criada abre caminho para investigar se outros isótopos — por exemplo, de magnésio ou cálcio — também preservam a assinatura do proto-Terra. Isso pode ampliar a busca por “fósseis” químicos em amostras perfuradas em grandes profundidades ou trazidas à superfície por vulcões.
O que muda para o leitor e para o mercado
Na prática, a revelação reforça a importância de pesquisas de alta precisão para compreender a origem da Terra e, por extensão, a dinâmica de recursos naturais. Empresas de energia geotérmica, mineração de metais raros e exploração de lítio podem se beneficiar de modelos mais refinados sobre calor interno e composição do manto. Já para o público em geral, o estudo oferece nova perspectiva sobre a história do planeta que habitamos e ajuda a explicar por que ele sustenta condições únicas para a vida.
Curiosidade
Você sabia que o potássio-40, além de traçar a história da Terra, contribui para a radioatividade natural do corpo humano? Pequenas quantidades desse isótopo estão presentes em alimentos como banana, batata e grãos. Assim, ao consumir esses alimentos, cada pessoa carrega consigo uma “assinatura” radioativa mínima, relacionada ao mesmo elemento que revelou os vestígios do proto-Terra.
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