Crise de semicondutores força montadoras a buscar alternativas após bloqueio à Nexperia

Tecnologia

Montadoras de diferentes regiões intensificaram a busca por semicondutores depois que Pequim proibiu a exportação de produtos da fabricante holandesa Nexperia a partir da China. A medida, anunciada poucos dias após o governo da Holanda assumir o controle operacional da companhia por temer transferência de tecnologia para a controladora chinesa Wingtech, elevou o risco de uma nova interrupção na produção automotiva mundial.

Estoques limitados expõem vulnerabilidade da cadeia

A Nissan informou ter componentes suficientes para manter suas linhas até a primeira semana de novembro, mas reconheceu não ter “visão completa” da situação adiante. “Mesmo após os aprendizados da pandemia, continuamos dependentes de fornecedores menores, difíceis de monitorar”, afirmou Guillaume Cartier, diretor de Desempenho da marca, durante o Japan Mobility Show, em Tóquio.

A Honda suspendeu a produção em uma fábrica no México e ajustou turnos nos Estados Unidos e no Canadá. Segundo a empresa, o realinhamento busca evitar a falta repentina dos chips produzidos pela Nexperia, amplamente utilizados em módulos de potência, gerenciamento de bateria e sistemas de assistência ao motorista.

No Brasil, um representante do governo federal admitiu que algumas montadoras instaladas no país podem paralisar operações “em duas a três semanas” se a logística não for restabelecida. Dados da Secretaria de Desenvolvimento Industrial indicam que a indústria automotiva nacional mantém, em média, apenas 15 dias de inventário para semicondutores críticos, número considerado baixo por analistas.

Pressão política transforma escassez em problema geopolítico

A última crise global de chips, entre 2020 e 2022, esteve ligada a interrupções causadas pela Covid-19 e à alta demanda por eletrônicos. O cenário atual é diferente: “Agora o cerne é político”, avaliou Ola Källenius, presidente-executivo da Mercedes-Benz. A companhia alemã afirma estar “preparada no curto prazo”, mas admite procurar fornecedores alternativos em diversos continentes.

Especialistas em comércio internacional observam que a decisão chinesa de bloquear as exportações da Nexperia é resposta direta às restrições impostas por governos ocidentais sobre transferência de tecnologia sensível. “Cadeias globais fabris tornaram-se reféns de disputas entre Estados”, apontou Klaus Schmitz, sócio da consultoria Arthur D. Little. Para o consultor, empresas e autoridades devem negociar rapidamente com Pequim para evitar paradas prolongadas.

A dependência de chips tornou-se ainda mais crítica porque veículos eletrificados podem concentrar até 3 mil dispositivos semicondutores, ante cerca de 1,5 mil em modelos a combustão. De acordo com a associação mundial de fabricantes (OICA), cada dia parado custa ao setor US$ 450 milhões em receitas não realizadas.

Planos de contingência e impacto no consumidor

Desde a confirmação do bloqueio, montadoras avaliam três frentes de ação:

  • Redistribuição de peças entre fábricas de diferentes países para priorizar modelos de maior margem;
  • Substituição de componentes por chips equivalentes de outros fornecedores, quando certificados pelas agências reguladoras;
  • Negociação direta com governos para liberar carregamentos já produzidos na Ásia.

Segundo relatórios internos obtidos por consultorias, algumas marcas estudam reduzir temporariamente funções não essenciais em determinados veículos, estratégia semelhante à adotada em 2021, quando carros chegaram ao mercado sem sistemas de navegação ou com bancos traseiros sem aquecimento.

Para o consumidor final, o principal reflexo pode ser o alongamento nos prazos de entrega a partir de novembro. Concessionárias de mercados como Estados Unidos, Brasil e Alemanha já sinalizam possíveis reajustes de preços caso o impasse dure mais de um mês.

Além disso, os atrasos ameaçam comprometer metas de eletrificação. Governos da União Europeia preveem banir a venda de veículos a gasolina em 2035; qualquer gargalo logístico eleva a pressão para que a indústria acelere acordos locais de produção de semicondutores automotivos.

Possíveis cenários e próximos passos

Analistas de mercado trabalham com três hipóteses principais:

  1. Resolutivo de curto prazo – Negociação direta entre China e Holanda flexibiliza as restrições em poucas semanas, minimizando impacto.
  2. Escalada moderada – Bloqueio persiste até o primeiro trimestre de 2024, levando montadoras a direcionar investimentos para foundries na Ásia e nos Estados Unidos.
  3. Conflito prolongado – Sanções adicionais surgem, pressionando governos a subsidiar produção doméstica e elevando preços finais de veículos em até 10%, segundo projeções da Arthur D. Little.

Enquanto isso, empresas de semicondutores observam oportunidade de conquistar novas fatias de mercado. Fabricantes como Infineon, STMicroelectronics e ON Semiconductor relataram, em conferências recentes, aumento de consultas de montadoras em busca de contratos de longo prazo.

Para o leitor, isso significa que a disponibilidade de novos modelos, especialmente elétricos ou híbridos, pode oscilar nos próximos meses. Quem planeja trocar de carro ainda em 2023 deve considerar possíveis atrasos de entrega ou incrementos de preço, caso não haja solução diplomática rápida.

Curiosidade

Um veículo médio de hoje contém mais linhas de código que um jato comercial — são cerca de 100 milhões contra 15 milhões, segundo a consultoria McKinsey. Cada função eletrônica depende de chips como os fornecidos pela Nexperia, demonstrando como a indústria automotiva se transformou em um dos maiores consumidores de semicondutores do planeta.

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