Aquisição da Mynaric pela Rocket Lab enfrenta escrutínio de soberania na Alemanha

Ciência

O governo alemão analisa a proposta da norte-americana Rocket Lab para adquirir a desenvolvedora de terminais ópticos Mynaric, sediada em Munique. A operação, anunciada em março por cerca de US$ 150 milhões, precisa de aval sob as regras de investimento estrangeiro direto do país. Enquanto Berlim avalia a transação, cresce o debate sobre como a compra pode impactar a estratégia europeia de autonomia em defesa e comunicações via satélite.

Pressão por capacidade industrial própria na Europa

Nos últimos meses, a União Europeia intensificou iniciativas para fortalecer cadeias produtivas locais em setores estratégicos. Entre essas ações destaca-se o programa IRIS² (Infrastructure for Resilience, Interconnectivity and Security by Satellite), previsto para fornecer comunicações seguras a governos, forças armadas e empresas do bloco. Documentos oficiais indicam que a participação em contratos do IRIS² pode ser restrita a companhias classificadas como “controladas por europeus”.

Nesse cenário, a dúvida central é se a Mynaric, uma vez incorporada à Rocket Lab, continuaria qualificada como entidade europeia. Especialistas em direito regulatório explicam que o critério de controle difere em cada país, mas costuma envolver participação acionária majoritária e poder de decisão. Caso a empresa perca o status de controle europeu, poderia ficar de fora de licitações multibilionárias financiadas pela União Europeia.

Richard French, vice-presidente de desenvolvimento de negócios da Rocket Lab, afirmou em evento do setor que a companhia pretende “fortalecer a capacidade de a Mynaric competir em programas europeus” e, se necessário, adaptar sua estrutura para atender aos requisitos de elegibilidade. Ele não antecipou, porém, quais ajustes societários poderiam ser implementados.

Interesses nacionais em jogo

Além da política industrial da UE, a compra é avaliada à luz dos interesses econômicos internos. A Alemanha planeja injetar cerca de € 40 bilhões em tecnologias espaciais de defesa nos próximos cinco anos, segundo dados do Ministério da Defesa alemão. O objetivo é reduzir dependência de sistemas norte-americanos e ampliar a produção doméstica de hardware espacial.

Consultores ouvidos em conferências do setor ressaltam que, em processos de crivo de investimento, Berlim costuma ponderar manutenção de empregos, transferência de know-how e permanência de instalações no país. Caso a transação seja aprovada, “o regulador provavelmente exigirá compromissos concretos”, afirmou Randy Segal, advogada especializada no mercado espacial.

Para a Rocket Lab, a aquisição representa um ponto de entrada na Europa. A empresa, com sede em Long Beach, Califórnia, fabrica veículos lançadores e satélites, mas ainda não possui base industrial no continente. Segundo French, ampliar a presença local pode abrir portas para novos contratos e aproximar a companhia de programas financiados pelo Fundo Europeu de Defesa.

Tecnologia crucial para constelações

A Mynaric é conhecida pelo terminal óptico CONDOR Mk3, capaz de realizar ligações a laser entre satélites. O equipamento já foi selecionado pela Agência de Desenvolvimento Espacial dos EUA (SDA) para a constelação Proliferated Warfighter Space Architecture, composta por centenas de artefatos de órbita baixa.

Peter Beck, CEO da Rocket Lab, declarou anteriormente que a decisão de adquirir a Mynaric ocorreu após a seleção desses terminais para um contrato de US$ 515 milhões da SDA. Para Beck, o produto “une leveza e alto desempenho”, requisitos decisivos para missões que exigem transmissão segura de dados em alta velocidade.

No contexto europeu, terminais a laser são apontados por analistas como peça chave para comunicações militares resilientes. Ao contrário de links por rádio-frequência, feixes ópticos são menos suscetíveis a interferência e espionagem. Assim, a capacidade de produzir esse hardware dentro do bloco é vista como fator estratégico.

Próximos passos e impacto para o mercado

A legislação alemã não impõe prazo fixo para conclusão da análise de investimentos estrangeiros. Em média, processos similares podem durar de três a seis meses, mas casos com sensibilidade nacional costumam se estender. Enquanto não há decisão final, a Mynaric continua operando de forma independente e listada nas bolsas de Frankfurt e Nasdaq.

Relatórios de mercado indicam que a injeção de capital da Rocket Lab poderia acelerar a expansão da linha de produção da Mynaric e reduzir custos unitários. Por outro lado, caso a aquisição seja vetada ou condicionada, a empresa alemã poderá buscar outras parcerias ou financiamento público para sustentar o ritmo de crescimento.

Para o leitor que acompanha inovação espacial, o desfecho do processo influencia diretamente a competitividade das constelações europeias. Se a compra for aprovada, há chance de integração rápida entre plataformas de lançamento, satélites e links ópticos, encurtando prazos de entrega. Em caso de recusa, a Europa reforça a sinalização de que prefere manter controle nacional sobre tecnologias sensíveis, o que pode impactar prazos e custos de novos projetos.

Curiosidade

Embora tecnologias de comunicação a laser sejam vistas como novidade, o primeiro experimento bem-sucedido nesse campo ocorreu em 1963, quando a NASA enviou um feixe de laser da Terra à Lua, refletido por um espelho colocado pela missão Apollo. O princípio óptico é o mesmo utilizado hoje nos terminais da Mynaric, porém miniaturizado para caber em satélites de poucos quilogramas.

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