Um levantamento conduzido pelo economista comportamental Keith Chen, da Yale School of Management, aponta que a maneira como cada idioma expressa o futuro pode ter reflexos mensuráveis no comportamento financeiro e na saúde das pessoas. A pesquisa analisou indivíduos com perfis socioeconômicos semelhantes, mas falantes de línguas diferentes, e identificou discrepâncias significativas em escolhas relacionadas a poupança, prática de exercícios e hábito de fumar.
Futuro gramatical: forte ou fraco
Em inglês, o futuro costuma ser separado do presente por estruturas claras, como o uso de “will”: “It will rain tomorrow”. Já em alemão, holandês, norueguês, dinamarquês, sueco, estoniano e finlandês, é comum empregar o presente acompanhado de um marcador temporal, algo como “Amanhã chove”. No mandarim, não existe um tempo verbal dedicado ao futuro; o contexto ou advérbios sinalizam quando algo ocorrerá.
Segundo Chen, essa distinção – chamada de “forte” quando há clara separação e “fraca” quando não há – influencia a percepção de distância temporal. Quanto mais o idioma “aproxima” amanhã de hoje, maior a tendência de o falante considerar o futuro durante as ações do presente.
Impacto em finanças e saúde
Os resultados revelam que falantes de línguas com distinção fraca entre presente e futuro foram 31% mais propensos a poupar dinheiro anualmente e se aposentaram com 39% mais recursos do que pessoas de perfis equivalentes que usam idiomas com separação forte. Além disso, registraram 24% menos incidência de tabagismo, 29% mais adesão a atividades físicas e 13% menor taxa de obesidade.
O estudo sugere que, ao tratar o amanhã como parte do agora, esses indivíduos se mostram mais dispostos a sacrificar consumo imediato em prol de benefícios posteriores, como economizar ou manter hábitos de vida saudáveis. Contudo, o autor reconhece que idioma pode ser marcador, e não causa direta, de comportamentos orientados ao futuro. Fatores culturais mais profundos podem influenciar simultaneamente linguagem e decisões.
Outras formas de a língua moldar a percepção do tempo
Diversas pesquisas indicam que o sentido de leitura também interfere na maneira de organizar mentalmente a linha temporal. Povos que escrevem da esquerda para a direita, como usuários do português ou do inglês, costumam visualizar o tempo avançando nesse mesmo sentido; comunidades que escrevem da direita para a esquerda, como falantes de árabe ou hebraico, tendem a imaginar o fluxo temporal de modo inverso.
Para além da escrita, expressões idiomáticas e metáforas espaciais – “à frente”, “atrás”, “próximo”, “distante” – alimentam representações mentais que influenciam planejamento, memória e tomada de decisão. Dessa forma, a língua se mostra um componente discreto, mas constante, na construção de conceitos abstratos.

Imagem: Jr Korpa
Chen não descarta que fatores sociais, educacionais ou familiares expliquem parte das diferenças observadas. Ainda assim, ao comparar indivíduos com renda, nível de escolaridade e contexto demográfico semelhantes dentro de um mesmo país, o pesquisador encontrou correlações robustas entre estrutura gramatical e escolhas cotidianas. Para a comunidade acadêmica, o trabalho reforça a necessidade de investigar como linguagem e cultura se entrelaçam na formação de hábitos.
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Em síntese, a forma como cada idioma lida com o tempo verbal pode influenciar se uma pessoa economiza, pratica exercícios ou evita o cigarro. Compartilhe este conteúdo com quem se interessa por linguagem e comportamento e acompanhe nossas próximas publicações.
Curiosidade
Uma diferença menos conhecida entre idiomas ocorre na contagem de números. Em mandarim, a estrutura “dez-dois” para “doze” facilita operações mentais de soma e subtração, segundo estudos de psicologia cognitiva. Pesquisadores observam que crianças chinesas costumam dominar conceitos de matemática básica antes de colegas ocidentais, possivelmente por esse sistema numérico mais transparente. Isso reforça a tese de que a língua não apenas descreve o mundo, mas também molda a forma de pensar.